Entrevistas

Nome: Djan Ivson
Família: Cripta
Assina: Cripta Djan
Pixa desde: 1996

Arte Proibida: Por que você pixa?
Djan: Foi uma forma que eu encontrei de não deixar minha existência passar em branco. A gente vive em uma sociedade onde as pessoas são valorizadas pelo capital, pelo material... Na pixação a gente não precisa de nada disso para ser valorizado, para ser reconhecido. Não precisa do poder econômico para poder ter um reconhecimento, num precisa ter um carro ou uma moto. Basta pegar uma tinta e sair escrevendo o nome pela parede e aí você começa a ter um reconhecimento social de uma forma mais direcionada, é um reconhecimento social mais restrito para aquele meio que você vive, né? A pixação é meio que uma sociedade alternativa.

AP: Qual a importância dos points?
Djan: Os points são o meio social da pixação. Eles são uma espécie de termômetro da pixação. O cara vai ali pra realmente saber como está sendo o reconhecimento dele; se o pixo dele tá sendo reconhecido; se tá conseguindo se destacar mesmo na paisagem urbana da cidade.

AP: Você considera o pixo uma arte?
Djan: Sem dúvida! Uma das coisas que constitui a pixação também é a arte. Porque tem todo um processo de criação das letras, tem uma técnica pra se pixar é uma coisa que você aprimora com os anos, não é do dia pra noite. E a tipografia faz parte das artes plásticas. Acho que as pessoa se questionam da apropriação ilegal... Isso incomoda, né? E aí ganhou esse rótulo de vandalismo. Mas, na realidade, a pixação é uma expressão artística. É muito mais que isso, é uma expressão política, anarquista, libertária. Hoje em dia, na arte contemporânea; a pixação é o que existe de mais puro e verdadeiro, porque o pixador é o único artista que não tem pretensão financeira. Hoje em dia, a maioria dos artistas já nascem pro mercado, saem da faculdade e vão direto pro mercado da arte, já pensando em vender a arte dele como um produto. Os valores dos artistas estão se perdendo. Antigamente, os artistas eram valorizados pelo seu trabalho, mas não esperavam pelo retorno direto que é uma consequência. Acho que o artista de verdade não tem que criar a obra dele pra ser vendida. Não tem mais subversão na arte. Os únicos artistas subversivos, hoje em dia, são os pixadores, porque não tem essa pretensão financeira. Pelo contrário, eles investem: compram tinta, correm o risco de ser processado criminalmente, corre o risco de levar um tiro; coloca a integridade física e jurídica pra estar deixando sua marca e se a gente for analisar nenhum outro artista faz isso.

AP: Vale a pena?
Djan: Vale a pena porque dentro dessa busca existencial, a superação é um dos fatores que valoriza na caminhada do pixador. Não são todos os pixadores que arriscam escalar as coisas. tem o pessoal que consegue ter a notoriedade espalhando sua marca pela cidade, pixando bastante. Tem os que gostam de se aventurar mais, não tem preço. O pixador é o cidadão mais aventureiro da cidade.
Escalar um predio é uma coisa incrível, porque você não tem preparo físico, equipamento adequado e você está contra tudo e todos. É uma sensação de estar sozinho no mundo, é você e você, ali naquele momento. Isso é muito gratificante. Só o pixador vai saber qual é a sensação de estar colocando a vida dele no limite. Acho que não vale a pena morrer, acho que vale a pena a gente fazer tudo isso e preservar a nossa integridade. É perigoso, mas tem como ter uma segurança pixando. Eu nunca cai, eu sou uma prova viva. Mas tem amigos meus que já morreram. Ai, a hora da morte é que a gente se questiona.

AP: Você se questionou, mas o que te fez voltar a pixar?
Djan: É aquilo. A gente fica abalado, mas a pixação... Quando o cara vira pixador pra valer, é difícil, é uma coisa que vai pro sangue. Os caras que começaram a pixar nos anos 80 pixam ate hoje. Às vezes você se afasta um pouco mas perder o vinculo total é difícil. É um vicio, uma obsessão. O cara vira pixador é igual a um dependente químico, ele vai se tratar, vai tá ali tentando, mas ele nunca vai conseguir se livrar totalmente daquilo. A pixação parece que vai direto pro sangue do pixador.

AP: Quem pixa em lugar mais alto tem um reconhecimento maior?
Djan: Eles conseguem uma notoriedade mais instantânea. Pixadores que em um ano se consegraram mais que um pixador que esta ali há vinte anos pixando. Porque ele já foi nos alvos certos. Hoje em dia tem um fator que é a tecnologia. A gente ta na era digital, eu peguei a época que não tinha isso, então eu tive que erguer meu ibope na marra.

AP: Como a família aceitou o fato de você querer virar pixador?
Djan: Eu fui criado só com mulheres. Meus pais se separaram cedo, então minha mãe foi morar com a irmã dela e não tinha nenhum homem na família, então eu fui um menino rebelde, minha família não conseguia me controlar. Ai no meu primeiro rolê eu fui pego e já tomei um banho de tinta, então não tinha como esconder da família. Quando cheguei em casa tomei um esculacho, então a partir dai foi difícil esconder. Tentei esconder por um tempo, mas depois assumi. Minha família tem uma cabeça boa, ela não é uma família preconceituosa. Esse é um fator que me ajudou também, porque tem amigo meu que parou mesmo por causa da família do que por eles. Uns que até hoje enganam a família "não, parei com isso ai há muitos anos!" e o cara tá acabando com São Paulo "não, não, não sou eu não...é um moleque que eu coloquei...".

AP: Os pixadores são um grupo unido?
Djan: No geral, nós somos unidos, mas temos que melhorar bastante essa união, porque o ego atrapalha muito essa união. Primeiro passo que a gente deu foram os ataques de 2008, que a gente soltava os convites no point explicando a proposta da ação que era em prol do movimento. Essas ações foram o momento de deixar o ego de lado e correr atrás do movimento e essas ações são muito difíceis porque a galera corre muito em prol da promoção deles próprios. Eu acho que unidos dá pra fazer muita coisa, você viu que a  gente conseguiu virar pauta nacional com aquelas intervenções, até repercutiu fora do país. Isso foi uma coisa que realmente trouxe a pixação pra discussão no campo da arte. O Rafael sacrificou o diploma dele, ele tava ali se formando em artes plásticas e defendia a pixação como a tese dele de arte. Ele resolveu levar a galera pra pixar a faculdade no dia da formatura como tese de conclusão dele. Mas ele não comunicou a faculdade pra esse trabalho se manter na legitimidade, mas se ele pedisse com certeza que não iam deixar. E a pixação não precisa pedir pra ninguém e a gente tem essa vantagem.

AP: Como os pixadores veem o graffiti?
Djan: Depende, cada um tem um ponto de vista. Mas a pixação e o graffiti sempre tiveram a relação muito estreita, desde as antigas. O graffiti é uma cultura que chegou aqui meio que enlatada, porque quanndo ele chegou ela já vinha tendo um reconhecimento artístico na Europa. Então ele não veio como uma coisa ilgeal, ele veio como uma expressão artística pacifica. Então o graffiti se desenvolveu em São Paulo sempre como uma intervenção pacífica, com o apoio das autoridades, do estado e da sociedade. Então o que a sociedade assimilou, onde tava grafitado não era mais pixado, então começaram a usar o grafiti como antídoto contra a pixação, então isso sempre gerou conflito. O pixador vai lá se arrisca, ai o grafiteiro vem lá com o apoio do proprietário e faz a pintura dele. Isso sempre gerou conflito e vai continuar gerando.

AP: Você deixaria de ser pixador pra virar grafiteiro?
Djan: Não, porque acho que não tem como você deixar de ser uma coisa pra ser outra, acho que isso é babaquice. A maioria dos caras que falam "ah, eu era pixador, agora sou grafiteiro". Na realidade, nunca foram pixadores, foram aventureiros. Nós que somos pixadores, costumamos dizer que tem os caras q se aventura: os aventureiros e os pixadores. Tem uma galera que se aventura a ser pixador, mas não chegou a se firmar. O cara pra ser considerado pixador ele tem que ter uma expressão na rua, por minima que seja. Nem que seja no bairro dele.

AP: O pixo chega a ser uma tribo urbana?
Djan: Não, chega a ser uma tribo urbana total. Porque existe uma tradição, um código, regras, uma hierarquia, é um movimento que tem uma consistência, tem uma organização, existe no pais inteiro. Cada estado com a sua estética e tradições, mas com a mesma filosofia: PIXAR!

AP: Como os pixadores enxergam a sociedade?
Djan: Os pixadores, na maioria das vezes, são jovens que se sentem excluídos da sociedade e por isso acabam migrando nessa tribo, nessa sociedade alternativa, porque é onde ele vai ter um reconhecimento existencial. Porque a sociedade hoje em dia parece que está alienadas, robotizada por aqueles valores pré estabelecidos. A pixação rompe com todos esses valores, são outros valores! Então a gente acaba sendo vistos como inimigos pela sociedade, mesmo fazendo parte dela, a gente se sente em uma sociedade a parte.

AP: E como é a mulher no cenário da pixação?
Djan: Sempre existiu, mas parece que nunca aumenta, se mantém nos 10%. A gente é muito triste com isso (risos). As minas começam a pixar e acabam sempre namorando com algum pixador e ai envolve o machismo, ai acaba o rolê. As únicas minas que realmente conseguem pixar, são aquelas independentes. Elas começam a pixar até o momento que começam a namorar sério um pixador, ai acabou. É assim que acabam as pixadoras (risos). Mas também existe a questão da pixação ser um movimento muito viril. Porque existe força física, enfrentar a polícia: imagine uma mulher na mão de uma Força Tática, os caras já são covardes, já pegam pesado com a gente que é homem... E também tem o preconceito...

AP: O que você tem a falar sobre as pessoas preconceituosas e conservadoras?




AP: O que pensava da pixação antes de pixar?
Djan: Eu achava meio babaquice, na época eu andava de patins, jogava bola ... Ai meus colegas começaram a pixar, ai automaticamente eu comecei a fazer isso dentro da escola. Ai aquela notoriedade que eu ganhei na escola eu percebi que queria ela nas ruas, no bairro, ai fui espalhando até ser conhecido na cidade inteira.

AP: Qual o futuro da pixação?
Djan: O futuro da pixação será se manter na transgressão. E o que eu espero é que a galera não use a pixação só em prol do seu reconhecimento existencial, mas que use ela também como  instrumento de revolução e questionamento. Eu acho que o caminho que a pixação tem que seguir, pelo menos é o que eu to tentando direcionar, é justamente essa consciência mais política. O futuro da pixação é se manter na liberdade.

Nome: Victor
Família: -
Assina: -
Pixa desde: março de 2011

AP: Por que você escolheu a pixação?
Victor: Me identifiquei como uma forma de mostrar o que eu quero.

AP: Por que você acha que tem tanto preconceito com a pixação?
Victor: Porque tem gente que faz muita coisa coisa errada. Tem gente que usa sem autorização. Eu uso mais lugares do governo ou lugares autorizados para o graffiti, que eu faço também.

AP: E qual a diferença entre graffiti e pixação?
Victor: Graffiti é como se fosse uma obra de arte e pixação é um protesto.

AP: E você pixa pra protestar ou marcar seu território?
Victor: Pra protestar.

AP: E sobre o que você protesta, geralmente?
Victor: Contra a proibição da maconha...

AP: Você considera a pixação como uma tribo urbana?
Victor: Não, não considero. Acho que é algo diferenciado...

AP: Você acha que faz parte de uma família? Qual?
Victor: Acho. A do pessoal que está na mesma situação de pixar por protesto.

AP: Pixação é arte? Por que?
Victor: É, pela forma de expressar um sentimento que vem da cabeça.

AP: Você venderia seu trabalho?
Victor: Se fosse uma pintura como o graffiti, sim.

AP: Mas por que você venderia o graffiti e não venderia o pixo?
Victor: Depende das circunstâncias. Uma pessoa não iria querer comprar um pixo; um pixo na casa dela.

AP: E como você enxerga a sociedade?
Victor: Deixa eu achar uma palavra... Eu definiria como ignorante.

AP: Você se sente inserido nessa sociedade quando você não tá pixando/grafitando?
Victor: Sim, eu só me sinto fora dela quando estou fazendo meu pixo.

AP: Qual você acha que é o futuro de você como pixador e da pixação?
Victor: Não sei, difícil ver um futuro bom, mas vai durar por muito tempo.

AP: Por você, continuaria?
Victor: Por mim continuaria!

AP: Você acha que o sistema vai acabar com ela ou não?
Victor: Não, não, difícil! O sistema nunca vai conseguir tirar tudo, sempre vai existir alguém que vai tá lutando.

AP: E quais modalidades você faz?
Victor: Só rua, mas pretendo fazer outras modalidades como escaladas e janelas...

AP: E qual a sensação quando você vê seu pixo?
Victor: É muito bom, você vê que conseguiu cumprir mais uma pixação.

AP: E você vê o graffiti como evolução do pixo?
Victor: Não, são coisas totalmente diferenciadas. O graffite é como se fosse um quadro na parede e o pixo é mais uma revolução.

AP: E o que você tem a dizer sobre as pessoas que tem preconceito?




Nome: William Vilson
Família: Panaks
Assina: PNKS
Pixaxa desde: 16 anos

AP: Por que a pixação e o que ela significa pra você?
William: Conheci a pixação através dos meus amigos. E já gostava de desenho antes. Comecei "rabiscando" com o giz da escola, depois fui fazendo os muros do bairro, junto com meus amigos, assinando Fuga W, em Carapicuíba. Em 2007, já estava pixando Fuga há um ano, mas decidi pixar a grife que eu pixo hoje que é PNKS, Panaks. Tenho uma grife dos "oS ToQTo", na Zona Leste. Me inspirava em alguns caras que já tinham rolê, como "Imagem". E foi assim que surgiu, a pixação pra mim é como se fosse o futebol, uma coisa que gosto, é um lazer. Desconto minha raiva e alivia meu stress. Pra mim é arte. Pessoal acha que só o pincel e a coisa tudo perfeitinha é arte, muitos entendem como vandalismo, mas ela tem um sentido. Ela surgiu na década de 70, na ditadura, onde as pessoas expressavam sua revolta nas paredes e continua até hoje. Nós vemos São Paulo como um grande caderno de caligrafia, onde muitos disputam por espaços para deixar suas marcas e o privilégio de um pixador é deixar seu pixo ali pra cinco anos depois, passar no mesmo lugar, e ver a marca dele. É impossível descrever a sensação. Pixação é muito louco e é arte!

AP: Como você, quanto pixador, enxerga a sociedade?
Will: E tenho planos e sonhos. Eu vejo a sociedade, mas a minha revolta não é com ela. Minha revolta é com os parlamentares que prometem muitas coisas pra molecada em época de eleição, mas depois some. Eles não dão condições melhores para as pessoas que tem uma vida sofrida. Eu vejo a pixação como um esporte pra molecada, na pixação elas encontram uma oportunidade de se expressar, ao invés de estarem envolvidas com o tráfico de drogas, por exemplo.

AP: Você se sente inserido na sociedade?
Will: Ah, eu não me sinto, porque cada um é cada um! Muitos veem o pixador como vagabundo, mas eu tenho meu trabalho e gosto da pixação, pretendo fazer uma faculdade de história da arte, pretendo me formar nessa área, entendeu? Não pago pau pra playboy, nem pra ninguém! Quero correr atrás dos meus sonhos e a pixação me trouxe essa possibilidade. E não tenho nenhum preconceito, também não tenho nada contra contra aqueles que tem. A gente enxerga de um jeito, eles enxergam de outro. Então, da mesma maneira que eles acham uma Tarsila do Amaral ou Pablo Picasso artistas, nós somos artistas da rua e artistas urbanos!

AP: O que você acha sobre o graffiti?
Will: O graffiti está lá em cima, mas tem alguns grafiteiros que não respeitam as agendas, porque alguns grafiteiros já foram pixadores, já curtiram essa arte e muitas vezes viram grafiteiros e esquecem de onde eles vieram, da raiz, da origem. Então é isso, graffiti é uma coisa bacana, não tenho nada contra, gosto de ver e admiro o graffiti. Da mesma forma que os pixadores respeitam os grafiteiros, os grafiteiros devem respeitar os pixadores.

AP: Falando em pixação, você considera a pixação como uma tribo urbana ou movimento?
Will: É um movimento onde você faz muitas amizades.

AP: Você venderia seu pixo?
Will: Não, porque nossas telas são os muros e o nosso museu são as ruas. E eu não preciso de dinheiro pra estar expondo a arte da pixação. O filme da nossa realidade acontece nas ruas.